Apesar do alinhamento do Brasil aos EUA anunciado pelo governo de Jair Bolsonaro, especialistas ouvidos pela Sputnik acreditam que, dentro e fora do BRICS, o governo brasileiro tem buscado manter relações pragmáticas e estratégicas com a Rússia.
Nesta quarta-feira (21), o presidente russo discursou perante o parlamento do seu país destacando atividades da Rússia junto ao BRICS e a outras iniciativas internacionais das quais Moscou faz parte. Segundo Vladimir Putin, a Rússia tenta desenvolver relações na base do respeito mútuo com a maioria absoluta dos países do mundo e pretende ampliar os contatos com os seus parceiros no quadro dos diversos blocos dos quais é membro.
Nesse mesmo discurso, o chefe de Estado também falou sobre as mediações de conflitos feitas por Moscou e sobre seus esforços em prol da estabilidade estratégica internacional, que caminham ao lado do desenvolvimento de modernos sistemas de armamentos, inclusive nucleares.
Putin declarou a necessidade de criar um novo sistema de segurança internacional, sublinhou o papel especial dos países signatários do tratado sobre armas nucleares e apelou a realizar um encontro dos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONUhttps://t.co/LqnxEsQOnB
— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) April 21, 2021
Ainda de acordo com o presidente russo, apesar dessa busca de Moscou por relações baseadas na diplomacia, a Rússia é alvo constante da má vontade e implicância de determinados governos, que, inclusive, tendem a levar outros parceiros a também adotar uma atitude antirrussa. Nesse sentido, Vladimir Putin comparou a situação de alguns desse países com o comportamento do chacal Tabaqui, do livro de contos “O Livro da Selva”, do escritor britânico Rudyard Kipling, que pulava ao redor do poderoso tigre Shere Khan acreditando que este era o dono da selva e, assim, poderia lhe conceder benefícios e proteção.
“Nós vemos o que está acontecendo na vida real. Como eu já disse, tentam implicar com a Rússia de todo lado, sem razão nenhuma. E, claro, logo, em torno deles, como em torno de Shere Khan [países que ameaçam a Rússia], surgem esses pequenos Tabaqui [países que imitam as nações que ameaçam a Rússia]. […] Uivam para obter favores de seu soberano”, afirmou o presidente.
Para analisar o papel da Rússia hoje como agente multilateral, suas contribuições para a estabilidade internacional e suas relações com o Brasil, a Sputnik ouviu três especialistas da área de relações internacionais sobre esses temas.
BRICS, Brasil e Rússia
A participação da Rússia no BRICS, bloco formado também por Brasil, Índia, China e África do Sul, é uma importante via de inserção russa no cenário internacional, sobretudo para um país que busca a multilateralidade como forma de atuação diplomática. É o que afirma, também em entrevista à Sputnik, o professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Charles Pennaforte, diretor-geral do Centro de Estudos em Geopolítica & Relações Internacionais (CENEGRI).
“Sob essa perspectiva multilateral, eu acho que a Rússia desempenha um papel muito importante dentro desse cenário contemporâneo”, pontua o acadêmico, destacando que essa participação russa nas discussões e mediações internacionais provoca certo desconforto a países como os Estados Unidos, que, independentemente do governo, ainda olham para Moscou com olhos da época da Guerra Fria.
Devido às hostilidades com que a Rússia tem de lidar historicamente e às consequentes preocupações com a sua segurança, as participações do país em fóruns e organismos internacionais também tem uma função, além de todas as outras, segundo Pennaforte, de servir de plataforma para Moscou deixar claras suas intenções para aqueles que demonstram preocupação com o fortalecimento das capacidades militares russas.
“Ela procura sempre pontuar isso seguindo as dinâmicas das relações multilaterais, nos fóruns internacionais, ONU, Conselho de Segurança, BRICS e Organização para Cooperação de Xangai. É uma forma que a Rússia tem de garantir a sua segurança. Mas acredito que ela não tenha nenhum interesse em expandir ou ir contra nenhuma nação. Hoje [21], o Putin falou isso claramente em seu discurso.”
Apesar das expectativas de uma aliança automática do Brasil com os Estados Unidos durante o governo do presidente Jair Bolsonaro, ao contrário de outros autodeclarados aliados dos EUA, o Brasil, ao longo desses últimos dois anos, não chegou a adotar uma postura totalmente antirrussa, se reunindo aos esforços liderados por Washington para tentar isolar Moscou.
Mesmo durante a administração de Donald Trump, suposto amigo pessoal de Bolsonaro, o governo brasileiro foi “chamado à realidade”, de acordo com o professor da UFPel, por empresários, grupos políticos e diplomatas que conseguiram explicar a falta de sentido em se criar problemas com outro parceiro do Brasil no BRICS, cujo banco, inclusive, foi responsável pela concessão de créditos ao Brasil de maneira muito mais vantajosa do que o país teria se fosse recorrer ao Fundo Monetário Internacional ou ao Banco Mundial.
O Brasil recuou no ranking global do PIB (Produto Interno Bruto) per capita em 2020 e deve continuar perdendo posições nos próximos anos, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) https://t.co/5mWbiKswzf
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— Sputnik Brasil (@sputnik_brasil) April 13, 2021